Estimulando o nervo vago – primeira parte: autotratamento para epilepsia

Imagem: Banco de imagens

Débora Oliveira

O sistema nervoso funciona como uma rede multidirecional de informações. São informações que transitam entre nosso cérebro e cada uma das terminações nervosas numa comunicação constante. Cada parte deste sistema tem sua importância e sua função.

O nervo vago é o protagonista do relaxamento. Seu nome, “vago”, vem de “vaguear”, visto que ele se espalha por várias regiões diferentes do corpo. Este nervo coordena o funcionamento do sistema nervoso autônomo, responsável pela regulação das funções vegetativas – que não intervimos conscientemente. São exemplos de funções vegetativas a circulação sanguínea, a digestão, o controle da temperatura corporal, a respiração (considerada uma função mista), etc.

O sistema nervoso autônomo atua de acordo com a estimulação do nervo vago. Quando este nervo está com estimulação adequada, somos capazes de relaxar, fazer uma boa digestão, respirar de forma tranquila. Mas, quando pouco estimulado, isto é, quando ele não consegue entrar em ação de forma consistente, podemos enfrentar problemas a longo prazo como depressão, enxaqueca, inflamação, artrite, epilepsia, entre outros.

Divulgação/USP

Nos últimos anos, muitas pesquisas têm comprovado como a estimulação do nervo vago provoca uma melhora significativa destes problemas. O mais impressionante é o caso da epilepsia. A epilepsia é um distúrbio genético ou adquirido (por trauma ou outras doenças) que leva à atividade excessiva e anormal das células nervosas do cérebro, causando convulsões frequentes. Durante uma convulsão, o indivíduo apresenta comportamento, sintomas e sensações que não podem ser controlados: movimentos descoordenados, confusão mental e, em algumas vezes, perda de consciência. Nos intervalos entre as crises convulsivas, nenhum ou poucos sintomas ocorrem.

Uma das formas de estimulação do nervo vago para o tratamento de epilepsia envolve a implantação de eletrodos na região lateral esquerda do pescoço. Esses eletrodos disparam estímulos intermitentes (intervalados) provenientes de um gerador implantado no tórax, semelhante a um marcapasso, e já há 6 dispositivos autorizados pela ANVISA no Brasil (1). A implantação deste dispositivo é realizada em centro cirúrgico, sob anestesia geral. Este método é de natureza invasiva, e só é realizado sob orientação médica. 

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Porém, existem outras formas de estimulação do nervo vago de forma natural. Ter o nervo vago estimulado com práticas cotidianas implica uma resposta mais rápida quando o corpo é exposto tanto ao estresse tanto no cotidiano quanto para lidar com a alta descarga elétrica proveniente das convulsões, voltando ao estado de relaxamento. A manutenção de vínculos sociais positivos também foi relacionada à estimulação do nervo vago por um grupo de pesquisadores norte-americanos (2), o que revela que o manejo da epilepsia ao longo da vida não está relacionado apenas à saúde individual, mas também a vínculos sociais saudáveis e motivadores. 

Na Eutonia, reconhecemos também que é importante desenvolver a sensibilidade deste nervo, de forma a RECONHECER SUA NECESSIDADE DE ESTIMULAÇÃO a cada situação. Visto que a Eutonia trabalha na regulação do tônus neuromuscular de maneira global, estimular um nervo quando ele já está hiper estimulado pode provocar mais impedimentos na relação deste nervo com o resto do sistema nervoso e motor. O tônus vagal, quando capaz de aumentar ou diminuir, tem sua flexibilidade garantida e sua conexão preservada com o resto de todo o corpo.

Os autores do portal The Hearty Soul fizeram um levantamento com práticas simples que podem ser empregadas pela própria pessoa para a estimulação do nervo vago. Práticas corporais como a meditação, respiração e até o canto são ótimas estratégias e podem ser utilizadas tanto por pessoas não doentes quanto no autotratamento da epilepsia. A tradução para o português foi feita por mim nesta imagem abaixo:

Nas próximas semanas, estou elaborando formas de estimulação do nervo vago a serem feitas pelos cuidadores através de minha interação com Fernanda (nome fictício, para preservar sua identidade) durante a pandemia. No caso dela, somos que cuidadores que precisamos implementar as práticas, e esse desafio tem sido inspirador. Logo mais, posto um guia aqui no site do Instituto Inclua. Fiquem ligados e ligadas, e também ativando seu nervo vago quando precisar descansar. Até o próximo texto!

“Porque a vida é feita para os fortes. Falo da força que se manifesta nos conflitos, e está presente mais do que nunca naqueles que sofrem, que lutam por sua sustentação física, intelectual, artística ou psíquica, os que querem viver porque amam a vida.” (Viviane Mosé)

Referências:

(1) RELATÓRIO PARA SOCIEDADE: Informações sobre recomendações de incorporação de medicamentos e outras tecnologias no SUS – ESTIMULAÇÃO DO NERVO VAGO COM DISPOSITIVO IMPLANTÁVEL PARA EPILEPSIA da CONITEC – Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias do SUS (CLIQUE AQUI).

 (2) Artigo: “How Positive Emotions Build Physical Health: Perceived Positive Social Connections Account for the Upward Spiral Between Positive Emotions and Vagal Tone”, por Bethany E. Kok, Kimberly A. Coffey, Michael A. Cohn, Lahnna I. Catalino, Tanya Vacharkulksemsuk, Sara B. Algoe, Mary Brantley, and Barbara L. Fredrickson (CLIQUE AQUI).

Débora é dançarina, professora e Eutonista. Graduada em Comunicação das Artes do Corpo – Dança pela PUC/SP e em Eutonia pelo Instituto Brasileiro de Eutonia. Estuda dança e terapias corporais desde 2003, atuando em escolas, ONGs, estúdios e centros culturais no Brasil e no exterior. Este texto faz parte do projeto Descobrindo Caminhos, feito em parceria com o Instituto Inclua.

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