Débora Oliveira
O sistema nervoso funciona como uma rede multidirecional de informações. São informações que transitam entre nosso cérebro e cada uma das terminações nervosas numa comunicação constante. Cada parte deste sistema tem sua importância e sua função.
O nervo vago é o protagonista do relaxamento. Seu nome, “vago”, vem de “vaguear”, visto que ele se espalha por várias regiões diferentes do corpo. Este nervo coordena o funcionamento do sistema nervoso autônomo, responsável pela regulação das funções vegetativas – aquelas que não intervimos conscientemente. São exemplos de funções vegetativas a circulação sanguínea, a digestão, o controle da temperatura corporal, a respiração (considerada uma função mista), etc.
O sistema nervoso autônomo atua de acordo com a estimulação do nervo vago. Quando este nervo está com estimulação adequada, somos capazes de relaxar, fazer uma boa digestão, respirar de forma tranquila. Mas, quando pouco estimulado, isto é, quando ele não consegue entrar em ação de forma consistente, podemos enfrentar problemas a longo prazo, como depressão, enxaqueca, inflamação, artrite, epilepsia, entre outros.
O nervo vago sai da base do pescoço, atrás das orelhas. Sua relação com a musculatura desta região é bastante intima: se os músculos e tendões estiverem muito tensos, ou se a coluna cervical estiver mal posicionada, a pressão muscular pode impedir o bom funcionamento do nervo vago. Vejamos alguns exemplos.
A tensão crônica nos músculos do pescoço tem sido ligada a dores de cabeça do tipo tensão. Correspondendo a quase 90% das dores de cabeça, as dores de cabeça do tipo tensão acontecem por músculos excessivamente apertados na parte de trás do pescoço e no couro cabeludo. Estas podem ser provocadas por muitos fatores, desde a falta de sono até a má postura, bem como pelo estresse geral e pela contenção na região do pescoço. Logo, as dores de cabeça crônicas são majoritariamente um sintoma de um desajuste muscular, e a musculatura tensa na região pressiona também o nervo vago.
Um dos motivos recorrentes de queixas de dor na região do pescoço, e que está se tornando cada vez mais comum entre os mais jovens, é a postura da cabeça para frente, ou o chamado “pescoço de corcunda”. Além do tempo excessivo olhando o celular ou em direção à tela do computador, esta condição também pode ser causada por dormir com um travesseiro muito alto, ler por longos períodos de tempo, ou qualquer atividade na qual a cabeça é puxada para frente e para baixo.
Com o tempo, esta postura pode causar desalinhamento permanente no resto da coluna vertebral, e também pode levar ao desgaste excessivo nos discos intervertebrais e apertar os nervos da região, principalmente o nervo vago. Lembrando que o nervo vago também regula a atividade respiratória. No caso de uma cifose torácica (que curva o peito e muitas vezes limita a capacidade de respirar profunda e completamente), a pessoa fica com sua respiração limitada devido ao comprometimento da inervação do pulmão e à estrutura ósseo-muscular desorganizada.
Desta maneira, o nervo vago está diretamente envolvido com a organização postural do pescoço. Mas, como ele está relacionado a muitas outras funções, principalmente àquelas ligadas ao descanso, a pessoa pode experienciar um mal estar generalizado que se espalha pelo corpo, apresentando sintomas que aparentemente não têm nenhuma relação com o pescoço. Então, é de se admirar que muitas pessoas que apresentam dores crônicas no pescoço tenham um ritmo cardíaco acelerado? Ou ansiedade? Ou depressão? Seu nervo vago está sendo retalhado a cada vez que mexem o pescoço e a cabeça. O nervo vago está simplesmente perturbado ou perdendo sua capacidade de regulação natural.
É importante desenvolver o reconhecimento da sensibilidade deste nervo, de forma a reconhecer como está sua estimulação a cada momento. Visto que a Eutonia trabalha na regulação do tônus neuromuscular de maneira global, estimular um nervo quando ele já está hiper estimulado pode provocar mais impedimentos na relação deste nervo com o resto do sistema nervoso e motor. O tônus vagal, quando capaz de aumentar ou diminuir, tem sua flexibilidade garantida e sua conexão preservada com o resto de todo o corpo.
Tratando-se do pescoço, é importante também trabalhar na qualidade das articulações de forma global. Enquanto o movimento na região precisa ser trabalhado de maneira lenta e com precisão, visto o tamanho diminuto das vértebras e suas articulações, é preciso estruturar o resto do corpo para suportar o peso da cabeça em sua verticalidade, o que alivia a sobrecarga desta região. Na Eutonia, trabalhamos de forma global, desenvolvendo a saúde local, e, para a saúde biodinâmica do pescoço, este princípio é ainda mais fundamental.
Os autores do portal The Hearty Soul fizeram um levantamento com práticas simples que podem ser empregadas pela própria pessoa na estimulação do nervo vago. Práticas corporais como a meditação, respiração e até o canto são ótimas estratégias. Em casos de dores crônicas, é importante procurar um profissional para orientar a organização postural, mas práticas cotidianas podem colaborar no processo de autocuidado.
Nas próximas semanas, estou elaborando formas de ativação do tônus vagal a serem feitas por cuidadores através de minha interação com Fernanda (nome fictício, para preservar sua identidade) durante a pandemia. Fernanda tem epilepsia e a estimulação do nervo vago tem sido comprovadamente eficiente no tratamento da doença. Logo mais, posto um guia de práticas a serem feitas por cuidadores aqui no site do Instituto Inclua. Fiquem ligados e ligadas, e também ativando seu nervo vago quando precisar descansar. Até o próximo texto!
“Quero escrever poemas em seu pescoço
Acima do osso, próximo ao seu coração
que está batendo tão rápido.”
(Claudia Fiumidiparole, tradução livre do Italiano)
Referências:
Livro “Eutonia – Um caminho para a percepção corporal”, de Gerda Alexander (Capítulo “Os princípios da Eutonia – O movimento”)
Artigo “6 Ways to Instantly Stimulate Your Vagus Nerve That Could Help Manage Depression, Inflammation, and More”, do Portal The Hearty Soul (CLIQUE AQUI).
Artigo “The Vagus Nerve, Neck Pain, Anxiety, Headaches, and Depression”, de Chris Centeno, MD, especialista em medicina regenerativa e ortopedia (CLIQUE AQUI).