Discurso INCLUA na íntegra da Audiência Pública sobre o projeto de lei 4956

“Não da mais para aceitar alguns padrões e acreditar em mudanças sem questionamentos”.

Caio Cesar Rodrigues Toledo

Eu, Caio Cesar Rodrigues Toledo, Mestre em Psicologia e atual presidente do Instituto INCLUA, gostaria de agradecer a todos que deixaram a segurança de seus lares para estar presente em um momento muito importante para a comunidade paraisensse. Caso você não esteja aqui, mas esteja acompanhando pela TV Câmara, saiba que teremos inúmeras outras oportunidades. Assim, se faz muito necessária a sua aproximação, mesmo que remotamente. Ainda falando sobre minha pessoa, além de possuir algumas tarefas e qualificações bem definidas, venho enfatizar que hoje mesmo será um dia muito desafiador. Não tenho problemas em defender minha verdade, seja aqui ou em outro lugar, mas a leitura nunca foi meu forte. Mesmo que sejam minhas próprias palavras, melhorou quando descobri assuntos que me encantavam. Sim, tenho essa e mais algumas limitações. Por isso, caso neste discurso tenha erros e ou minha leitura não te agrade, peço desculpas, mas me desafiarei a fazer meu melhor, afinal, não poderia correr o risco de não escolher as melhores palavras para a importância da noite que teremos, da mesma forma que não faria sentido esconder minhas falhas ou limitações. Elas fazem parte de quem sou e da minha evolução.

Lembremos que, em fevereiro do ano passado, solicitamos a mesma audiência pública, mas que foi adiada de forma responsável naquele momento, devido à pandemia que estamos enfrentando. Talvez muitos de vocês não tenham entendido o porque de serem convidados, mas espero esclarecer aos poucos. Com a volta de alguns serviços desta casa e com a paralisação de alguns atendimentos a este público, também em função da pandemia, acreditamos que, mesmo com algumas dificuldades, cumprindo todas as normas recomendadas, é possível realizarmos uma ótima noite de trabalho e diálogo sobre um assunto tão urgente.

 SIM, um assunto URGENTE, pois não é à toa que esta casa aprovou, por unanimidade, em julho de 2019, um projeto de Lei que “INSTITUI, NO ÂMBITO DO MUNICÍPIO DE SÃO SEBASTIÃO DO PARAÍSO, POLÍTICA PÚBLICA PARA GARANTIA, PROTEÇÃO E AMPLIAÇÃO DOS DIREITOS DAS PESSOAS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA, E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS”. Vale ressaltar e respeitar muito, visto que este projeto foi escrito por diversas mãos, como profissionais referências em suas áreas de atuação e familiares que, sem dúvidas, possuem PHD nas necessidades dos seus entes queridos, assim como das necessidades frequentemente negadas em diversos serviços que se fazem necessários para sua estimulação, como evidenciou a própria autora, a Vereadora Cidinha Cerize, a quem parabenizo pelo apoio e dedicação sempre. Lembrando que, naquele momento, obteve ainda a assinatura de nobres pares vereadores, a saber: Vinício Scarano, Sérgio Gomes, Marcelo de Moraes e Luiz das Graças. O projeto foi sancionado na sequência pelo Poder Executivo, que, no momento, era Walker Américo o prefeito.

Apesar de até então não ser perceptível melhorias no serviço prestado pelo poder público e/ou privado que caminhe ao encontro das demandas e necessidades levantadas no projeto de lei, fica aqui nosso alento, visto que um dos vereadores que assinaram tal projeto, validando assim sua importância e relevância, encontra-se hoje como chefe do Executivo do nosso município. Com isso, gostaria ainda de aproveitar o momento para agradecer os esforços do Prefeito Marcelo de Moraes, toda sua equipe, assim como profissionais da saúde no enfrentamento da pandemia, o que tem refletido nos números de leitos ocupados e diminuição de novos casos de Covid no município. Tenho a certeza que estes números só são possíveis pois tem uma comissão séria e estratégias bem fundamentadas tecnicamente que optam por uma postura enérgica e colaborativa, assim como a ajuda do cidadão pararaisensse, pois, sem a ajuda da sociedade, nenhum esforço, por maior que fosse, resultaria por si só nesta melhora. Então, parabéns a você cidadão que tem feito a sua parte e parabéns ao poder público, que tem feito a sua. Esta é a prova que juntos não somente somos mais fortes, mas mostraremos resultados efetivos, pois se, até em momentos de incerteza e muita dúvida de como agir, afinal nunca passamos por problemática parecida e ainda não possuímos modelos e exemplos de como enfrentar com eficácia tal situação, então sim, juntos podemos resolver problemáticas difíceis, transformar nosso entorno e torná-lo um lugar melhor.

Isto posto, hoje a ideia é iniciarmos uma diálogo amplo sobre as necessidades de uma população específica, mas vale ressaltar que não queremos evidenciar a dor de um grupo específico esquecendo os demais. Sabemos que muito ainda precisa ser feito para ofertarmos de forma efetiva todos os serviços respaldados pela Constituição, e muitas outras declarações, estatutos e leis a toda população, seja ela deficiente ou não. Como aqui focaremos na Pessoa com Deficiência, a Constituição Cidadã de 1988 garante direitos iguais a todos, por exemplo. Mas a sociedade brasileira ainda precisa progredir muito na implementação de serviços que disponibilizem acesso às pessoas com algum tipo de transtorno ou deficiência para avalizar as leis vigentes. Quando pensamos no sistema educativo, como previsto na própria Constituição, assim como na Lei da Pessoa com Deficiência, no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e outros documentos importantes, temos de garantir aprendizagens de qualidade para todos os alunos. De nada serve ter leis e instrumentos curriculares de grande nível se as aprendizagens deixarem de fora elevadas porcentagens de alunos.

Seguindo o tema sobre o prisma da Educação, falar de educação inclusiva, por exemplo, é diferente de falar de uma escola que se limita a abrir as portas a todos. É falar de uma escola que abre as portas de entrada e que garante que, à saída, todos alcançaram aquilo a que têm direito: um perfil de base humanista, ancorado no desenvolvimento de valores e de competências que os torna aptos ao exercício de uma cidadania ativa exercida em liberdade e proporcionadora de bem-estar.

No Brasil, segundo dados do Censo Escolar de 2017, 877 mil estudantes com algum tipo de deficiência estavam matriculados na Educação Básica. Delors (2003) destaca que a UNESCO elaborou documento no qual recomendou que fossem observados quatro pilares de conhecimento para a Educação do século XXI: “aprender a conhecer”, “aprender a fazer”, “aprender a viver juntos” e “aprender a ser”. Tais considerações possibilitam a mudança de paradigma, que amplia as responsabilidades da escola para além dos aspectos cognitivos, somando-se a convivência social e as características socioemocionais. Não só gostaria de evidenciar o aumento na responsabilidade, mas a necessidade desta ser dividida com outros setores, como ação social, esporte, lazer e cultura e outros que se fizerem necessários. Vocês conhecem Michael Phelps né? Era péssimo na escola e sabiam que a natação foi receitada como função terapêutica. O resultado já sabemos: maior medalhista olímpico da história.

Retomando os pilares do conhecimento, no “aprender a conhecer”, deverá haver investimento em uma aprendizagem com metodologia mais eficaz para absorção de um saber que se precisará aplicar lembrando que cada individuo absorverá de uma forma. “Aprender a fazer” está relacionado à prática profissional, considerando que é preciso pensar na amplitude das exigências do mundo do trabalho e propor um desenvolvimento não apenas de aspectos relacionados à inteligência, buscando aproximar de ambientes que valorizem suas potencialidades. O “aprender a viver juntos” é destacado como o grande desafio do século XXI, pois os conflitos sociais, polarização política, intolerância para o diálogo e a discriminação estão constantemente presentes na sociedade, e podemos dizer que agravados por conta do momento atual. Frente a isso, o autor enfatiza a importância de uma educação para a solidariedade. Por fim, o quarto pilar, “aprender a ser”, refere-se à necessidade de todo ser humano em ser preparado para a autonomia intelectual e para uma visão crítica da vida, de modo a construir seus valores, desenvolver a capacidade de discernimento e em como agir em diferentes circunstâncias da vida.

Portanto, quando nos referimos à formação integral do aluno, precisamos considerar temáticas como empatia, respeito pelo próximo, tolerância a frustração, autoconfiança, responsabilidade, socialização e outras habilidades que podemos chamar de não cognitivas, além dos interesses destes alunos. Também é preciso considerar as condições oferecidas aos professores para a coconstrução do aprendizado, transformando o aluno em protagonista de sua própria história, sendo capaz de planejar seu projeto de vida de forma a valorizar suas potencialidades.

No Brasil, temos ainda conjuntos consideráveis de alunos que não encontram sucesso nas escolas. As causas são múltiplas e todas elas complexas, requerendo necessariamente respostas que não são simplistas. A condição socioeconômica é um fator de exclusão dos alunos; dificuldades de aprendizagem associadas a déficits variados não facilitam no desenvolvimento de todos os alunos; lacunas socioemocionais criam barreiras às aprendizagens; grupos com transtornos e deficiências apresentam elevado risco de exclusão. Lembremos sempre: somos diferentes SIM e mais ricos graças às diferenças.

Assim sendo, à medida em que a inclusão de pessoas com deficiências e outros transtornos se torna mais frequente, fica evidente a necessidade de criação de medidas que amparem tal procedimento, para que, de fato, haja inclusão e atenda à política pública vigente dentro de sua amplitude e complexidade. Diversos são os setores da sociedade que precisam se adequar e não apenas as escolas, afinal, só uma coisa é certa: a pessoa com deficiência deixará a escola, mas a deficiência não deixará a pessoa. Então, se a deficiência acompanha a pessoa durante todas as etapas do desenvolvimento humano, como centrarmos esforços e olhares apenas na Educação Inclusiva?

A título informativo, a abordagem da deficiência caminhou de um modelo médico, no qual a deficiência é entendida como uma limitação do indivíduo, para um modelo social e mais abrangente, que compreende a deficiência como resultado das limitações e estruturas do corpo, mas também da influência de fatores sociais e ambientais do meio no qual está inserida. Nesta nova abordagem, utiliza-se como ferramenta a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF/OMS), no âmbito da avaliação biopsicossocial.

Com a CIF, consolidou-se o desenvolvimento conceitual relacionado às questões da deficiência e da incapacidade, saindo de uma classificação de “consequência das doenças” para uma classificação de “componentes da saúde” (CIF). Ultrapassaram-se, assim, muitas das críticas dirigidas à classificação de 1980, como sua conotação com o “modelo médico”, que estabelecia uma relação causal e unidirecional entre deficiência – incapacidade – desvantagem, que centrava-se nas limitações “dentro” da pessoa e apenas nos seus aspectos negativos e, portanto, não contemplava o papel determinante dos fatores ambientais. A mudança conceitual da deficiência foi estabelecida pela Convenção dos Direitos da Pessoa com Deficiência, proclamada pela ONU em 2006, que, em seu artigo 1º, dispõe:

“Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interações com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas”.

Segundo dados do IBGE 2010, 46 milhões de pessoas no Brasil apresentam alguma deficiência, o que chega a representar quase 25% da população nacional. Incluindo na análise os transtornos, esse número tende a aumentar significativamente, o que nos coloca diante de uma urgente discussão: como o poder público, empresas privadas e sociedade vêm fazendo sua parte para atingirmos a tão sonhada inclusão em diversos setores da sociedade.

Segundo António Guterres, secretário Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), “quando garantimos os direitos da pessoa com deficiência, ficamos mais próximos de alcançar as promessas central da agenda de 2030, de não deixar ninguém para trás”. Ele diz, ainda, que, embora ainda tenhamos muito a fazer, tem-se observado um progresso mundial importante para a construção de uma sociedade mais inclusiva para todos. 

O INSTITUTO INCLUA é uma associação sem fins lucrativos fundada em 2019, com a missão de oferecer apoio ao público-alvo, buscando promover o desenvolvimento global e a aprendizagem por meio de acolhimento, avaliação multidisciplinar humanizada e especializada, suporte às famílias e capacitação de profissionais, seja para melhoria da inclusão na comunidade escolar, nas empresas e na sociedade. Assim, nos vemos na obrigação de levantar este diálogo, torcendo para que muitos de vocês, profissionais de referências em suas áreas, nos ajudem a construir dias melhores, pois uma sociedade inclusiva passa pela necessidade de aprendermos a viver juntos, por meio do respeito as diferenças, empatia com a dor do outro e ao estender a mão para colaboração com o próximo.

Com isso, nos vemos na obrigação de estimular uma discussão rica cerca de um tema tão importante, que, sem dúvidas, impactará de forma muito significativa na qualidade de vida de toda a população, seja esta dentro Do Espectro ou não. Afinal, como acolher, entender e/ou potencializar questões que muitas vezes desconhecemos? Assim, a título de entendimento sobre  a definição do Transtorno do espectro Autista (TEA), utilizarei da descrição contida na lei, conforme contido no Art. 1°.

§1º – Para os efeitos desta Lei, é considerada pessoa com transtorno do espectro autista aquela portadora de síndrome clínica caracterizada na forma dos seguintes incisos I ou II:

 I – deficiência persistente e clinicamente significativa da comunicação e de interações sociais, manifestada por deficiência marcada de comunicação verbal e não verbal usada para interação social; ausência de reciprocidade social; falência em desenvolver e manter relações apropriadas ao seu nível de desenvolvimento;

II – padrões restritivos e repetitivos de comportamentos, interesses e atividades, manifestados por comportamentos motores ou verbais estereotipados ou por comportamentos sensoriais incomuns; excessiva aderência a rotinas e padrões de comportamento ritualizados; interesses restritos e fixos.

O Art. 2º se refere às diretrizes da Política Municipal dos Direitos das Pessoas com Transtorno do Espectro Autista. É um artigo muito importante, em que os incisos I e II têm muito a ver om este momento de diálogo iniciado hoje, ao qual gostaria de agradecer novamente a todos os presentes e quem nos acompanha remotamente. O Inciso I trata da intersetorialidade no desenvolvimento das ações e das políticas no atendimento à pessoa com transtorno do espectro autista, assim como da participação da comunidade na formulação de políticas públicas específicas, voltadas às pessoas com transtorno do espectro autista, e o controle social de sua implantação, acompanhamento e avaliação, no inciso II. Frente a estes dois incisos, justifico o convite a muitos de vocês e agradeço novamente a presença.

Já no Inciso III se refere à atenção integral às necessidades de saúde da pessoa com transtorno do espectro autista, objetivando o diagnóstico precoce, o atendimento multiprofissional e o acesso a medicamentos e alimentação adequada. Confesso que, neste tópico, ainda temos muito a evoluir. ´É nítido que nos últimos 10 anos a ciência tem evoluído muito no entendimento e no enfrentamento das peculiaridades frente ao diagnóstico e suas comorbidades. Vemos hoje metodologias sendo testadas, algumas inclusive com comprovações científicas de sua eficácia, sim, baseadas em muita evidência científica. Não estou aqui dizendo que precisamos começar amanhã a diagnosticar casos antes do primeiro ano. Isso mesmo. Já é possível, em muitos países desenvolvidos, por meio de exames específicos. Mas precisamos caminhar, melhorar, aproveitando inclusive deste número grande de informação que surge a cada dia.

O que não dá mais para aceitar é uma família ficar dois anos aguardando um procedimento avaliativo que pode impactar nos suportes que esta pessoa vai precisar para seu desenvolvimento. Não dá mais para a classe médica dizer que uma criança com três anos não falar é normal. Não dá mais para esperarmos chegar à adolescência, em que as interações sociais são mais exigidas, para aumentar o número de autistas leves que não possuem diagnóstico, afinal ele sempre foi tão funcional, e que experimentam suas primeiras crises de epilepsia devido à ansiedade frente a este momento e poucas habilidades sociais para enfrentamento.

A medicina tende a evoluir muito rápido com a ajuda da tecnologia e já estamos sentido esses impactos inclusive quando pensamos no quão rápido foi produzida a vacina para a Covid. Muitos dirão que demorou, que muitos já morreram, mas, considerando a própria historia da humanidade como parâmetro, a vacina mais rápida antes dessa demorou, em média, 3 anos. Assim, deixo uma reflexão, porque precisamos chegar a um ponto caótico para nos unirmos em prol de um mesmo movimento. Quando entendemos as especificidades do autismo e de muitas outras deficiência, entendemos o quão complexa se torna esta estimulação, justificando assim um olhar multiprofissional para a pessoa e suas potencialidade. E, quando falo multi, não me refiro apenas a ter acesso a diversos serviços, mas que estes serviços possuam estratégias em comum pensando no desenvolvimento global da pessoa, mas nunca esquecendo o olhar especialista e a estimulação de sua área de formação se assim se fizer necessário.

O Inciso IV discorre sobre o estímulo à inserção da pessoa com transtorno do espectro autista no mercado de trabalho, observadas as peculiaridades da deficiência e as disposições da Lei nº. 8.069 (Estatuto da Criança e do Adolescente). Fica aqui um questionamento. Pensemos no mundo do trabalho e suas inúmeras variações profissionais. Será que estamos respeitando nossos futuros artistas, futuros e brilhantes músicos, entre outras profissões tão importante para uma vida em sociedade? Quando pensamos em preparação para a vida, não estamos falando da necessidade de saber ler e escrever, ou até saber fazer contas matemáticas. Pois tem, SIM, crianças que talvez nunca desenvolvam tais habilidades, mas, se olharmos para suas potencialidades, veremos que temos muito potencial a ser estimulado.           

Peço licença para apresentar exemplo que muitos de vocês possam já ter ouvido falar, pois o trabalho incrível que vêm realizando há mais de 10 anos e impactando a vida de diversas pessoas com deficiência intelectual levou a minha visita junto com o Vereador Vinício ao trabalho brilhante que realizam para 300 pessoas em Belo Horizonte e um aprendizado ficou desta incrível experiência. Não importa a pergunta, A RESPOSTA É O AMOR. Esta mentalidade e exemplo os levou recentemente a defender nossa bandeira em um programa nacional, participando do The Wall no Caldeirão do Huck. Sim, estou falando de Leonardo Gontijo, fundador do Instituto Mano Down, e de irmão Eduardo, mais conhecido como Dudu do Cavaco. Em uma entrevista, Leonardo enfatiza que seu irmão não sabe matemática com facilidade e para execução de contas simples precisa de apoios concretos, e tá tudo bem. Mas conseguiram, por meio da música, estimular diversas questões, como a socialização, autoestima, habilidades motoras, memória operacional e, sim, conceitos básicos, inclusive para o aprendizado da própria matemática por meio dos ritmos e tempos musicais.

Poderia, ainda, dar um exemplo mais próximo, de um morador de nossa cidade que atendo há mais de um ano. As condições clinicas advindas do próprio TEA resultaram em diversas problemáticas adaptativas, seja na escola, no mundo do trabalho ou na busca por novas experiências durante as etapas do seu desenvolvimento. Sim, ele é AUTISTA e é adulto. Apesar de a discussão acerca do autismo ser maior hoje, e focado mais na infância, as condições clinicas acompanham a pessoa até a fase adulta, cabendo aqui citar frase de um autor desconhecido, que, quanto mais a pessoa com autismo caminhar sozinha, mais difícil se torna ajudá-la. Em contato com a sua história, fica claro o quanto o hiperfoco é sim um fator protetivo a este público, afinal seu hiperfoco é história da arte, pinturas, restaurações e, durante momentos de muita interação social, como na graduação, por exemplo, as habilidades sociais em defasagem o dificultavam menos naquele momento ao se aproximar de pessoas desconhecidas, mas com interesses em comum. Isso não quer dizer que as dificuldades na habilidade social diminuem nestes ambientes, mas as interações passam a ser menos conflituosas pelo interesse nos assuntos em comum.

O inciso V refere-se à responsabilidade do poder público quanto à divulgação da informação pública e à conscientização sobre o transtorno do espectro autista e suas implicações. Neste tópico, não expressarei nenhum comentário ou exemplo, mas será que as pessoas conhecem de fato? Fica aqui meu questionamento a todos que nos acompanham. E deixe aí seu comentário caso esteja assistindo remotamente. No inciso VI, que enfatiza sobre a formação e capacitação de profissionais especializados no atendimento à pessoa com transtorno do espectro autista, bem como aos pais e responsáveis, novamente vou me isentar de colocar o meu ponto de vista, mas cabe lembrar aqui citações do próprio atual prefeito aos investimentos feitos neste sentido em nosso município com os profissionais, quem dirá com as famílias. A família não possui hoje um serviço que contribua com o seu processo de formação e enfrentamento consciente. Precisamos implementar treinamento de pais para crianças com diagnóstico e, em casos de diagnóstico recente, a psicoeducação com intuito de esclarecer não apenas o nome da patologia, mas como a família pode ajudar neste enfrentamento, adaptações, redes de apoio e estimulações.

O inciso VII enfatiza a importância de estimular a pesquisa científica, a capacitação e meios de aplicação de sistemas de desenvolvimento humano e qualidade de vida das pessoas no Transtorno do Espectro Autista. Fica novamente meu questionamento. O que temos feito? Mas vale lembrar que, ao buscar respostas para as questões observadas no filho que fogem alguns padrões esperados pelo desenvolvimento dito normal, muitos pais, funcionais, que possuem trabalho, esposa, outros filhos, se descobrem também dentro do Espectro, afinal pesquisas apontam que mais de 80% dos casos são preditores por questões genéticas. Então, temos mais autistas que acreditamos, e é ampliando esta discussão e respeitando estas pessoas que mais pessoas terão interesse em assumir suas diferenças, afinal, muitos transformam suas limitações em potencialidades. E, por último, mas não menos importante  o inciso VIII refere-se ao fornecimento de passe livre no transporte público para pessoa com TEA e acompanhante, com direito a ocupar assentos destinados à pessoa com deficiência, que, apesar da troca atual da empresa, não sei dizer como a atual está procedendo, mas fica aqui nossa lembrança. 

Poderia ainda estender horas aqui falando sobre algumas questões que me orgulho de buscar a cada dia mais informação, mas confesso que tamanha busca ainda não resulta nem perto do que podemos fazer juntos. Se unirmos nossos saberes em prol desta população, poderemos fazer isso com outras problemáticas estruturais da nossa sociedade. Sei que nem sempre vou acertar no meu movimento tentando ajudar outras pessoas. Muitas inclusive relatam achar nobre minha disponibilidade em me expor, visando ao fortalecimento de causas que talvez não me representem em um primeiro momento. Mas minha causa é a inclusão sim, no conceito mais amplo e considerando a perspectiva de toda sociedade. Não acho que inclusão é para a pessoa com deficiência, e sim para todas as pessoas, afinal, todos nós, de uma forma atitudinal ou estrutural, necessitaremos de alguma adaptação do ambiente e das pessoas, buscando, assim, potencializar o nosso melhor.

Sabia dos desafios que enfrentaria quando decidi fazer desta a minha causa. Potencializar o ser humano jamais seria uma questão fácil, afinal, alguém cheio de falhas como eu, e nem sempre pronto a evoluir, mas continuarei incansável buscando uma sociedade mais equitativa, inclusiva e humanista. Então, agradeço o apoio de todos até aqui, e aprendi recentemente e fez muito sentido, altruísmo sem ciência não gera impacto. Então, é em nome das pessoas, mas é por respeito ao quanto evoluímos cientificamente nos últimos anos, que não da mais para aceitar alguns padrões e acreditar em mudanças sem questionamentos, afinal, a transformação acontece apenas após um questionamento. Sou FELIZ hoje por poder, nos últimos anos, aprender muito com meus erros e erros de outros. Isso me torna alguém melhor a cada dia. Obrigado a você parceiro de caminhada, bem-vindo a você que estas palavras representam.  

Caio é mestre em Psicologia e presidente do Inclua

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